quinta-feira, 20 de setembro de 2012

não precisamos de ser ricos para comprarmos mais palavras


Não precisamos de ser ricos para comprarmos mais palavras

 

Vamos ainda nas lições números três e quatro da aula de Português.

Tinha pedido uma composição sobre as férias como trabalho de casa. Tema já muito batido, mas sempre bem sucedido. É um CEF vivaço!

Chegaram duas alunas minutos depois.

As mais bonitas chegam agora. Os rapazes, com mais de dezasseis anos, sempre a topar as moças, escurinhas e elegantes. Elas sorriem, a olhar de soslaio, sem dar muita confiança.

Podem imaginar umas férias de sonho, se quiserem. Uma viagem aos Estados Unidos, por exemplo.

Não, stôra, há destinos mais fixes!

Escrevem e comentam para o lado, ao mesmo tempo. Pareceu-me o Rui: Comi, dormi, nadei…

Não se esqueçam de mostrar que têm bom vocabulário, ouviram?

Eu sou pobre, tenho um vocabulário pobre.

Pensei: as palavras estão isentas de impostos. Pelo menos, as pensadas.

Não é preciso ser rico para usar vocabulário rico. As palavras compram-se com os livros, mas vivem em liberdade em toda a parte. Gracejei.

Fui ouvindo comentar: a minha casa é uma vivenda. Tem escadas de caracol. Uma piscina bué grande. O meu pai não tem profissão. Não gosta de trabalhar. (Risinhos). Acho que não tem nome. Se calhar não foi batizado. Mas não se cala um minuto!

Olho para a lista, ainda impecável, do livro de ponto e reparo que este ano só dois tiveram direito a ASE escalão B. O que vale é que neste curso não peço manual.

Olho para a aluna que está à minha frente. Está grávida. Vai ter a criança em novembro. 17 anos. Entregou a composição entretanto feita e pediu para ir à casa de banho.

Nas minhas férias passeei com a minha família, estive em casa. Foram normais, só fui à praia uma vez porque o calor punha uma pessoa cansada.

Também fui 3 dias à feira de Corroios e depois já não fui mais porque os últimos dias é só confusão. Depois estive em casa até a escola começar.

Esta não inventou. Desabafou. Com erros, mas foi sincera.

Li outra: as minhas férias foram normais, não gostei muito, fiz poucas coisas. Fui à praia, comi fora, fui à feira, estive com os meus amigos, etc… estava quase sempre em casa, acordava muito tarde e dormia muito tarde. Não fui passar férias longe, não viajei.

Estas férias para mim não gostei, preferia ter ficado na escola não fazia nada em casa. Ao menos na escola estou com os meus colegas e faço alguma coisa.

Ainda tivemos tempo de ler em grupo o primeiro capítulo do João e o Segredo dos Gnomos, livro escolhido pelas delegadas de turma, diretamente no Centro de Recursos.

Será que este ano estes alunos percebem que as regras não são para gastar com discursos repetidos e imposições estéreis, mas para cumprir com sentido de responsabilidade para conquistar o incerto futuro?  

                                        Laranjeiro, 19 de setembro de 2012

                                            Quinta do Rouxinol

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