AS JANELAS
As janelas recebem as cortinas com gratidão. Parecem
chamá-las quando as pressentem esvoaçar um pouco. Sentir-se-ão menos despidas.
Mais aquecidas, também com a luz interior. Os raios de sol já não acariciam o
lar, há pouco recolhidos no horizonte de árvores. Uma cabeça que se erguesse
mais um pouco, maravilhar-se-ia com o céu matizado de um líquido pastoso cor de
tijolo molhado, riscado com veios de branco cinza que atenua o vermelho da construção
celeste, àquela hora, ao fim da jorna divina. Ainda não é dia do descanso do
Senhor. Os animais vêm recolher aos currais. Os pequenos pastores já só vêem o
conforto íntimo da única casa que conhecem e os acolhe. A casa de sua mãe. Pedro
ouve uma ladainha abafada e apressada de um pedal metálico de quem costura. A
calma está a inundar o ar e entranha-se no corpo. Pedro e o pai sentam-se no
alpendre a respirar o silêncio de fundo entrecortado da lida interior. Agora
apenas se distingue o tiquetaque do velho despertador de cabeceira esquecido no
alpendre, deitado sobre o vidro.
- Que faz aqui o tempo, pai? – Perguntou Pedro, intrigado.
O pai olhou o relógio, ergueu-o lentamente para não
interromper o seu labor e, quase distraidamente, com o tempo na mão direita,
disse-lhe com algum apetite:
- A tua mãe espera-nos. – E a porta foi o ruído mais
perceptível, até à alvorada. Quando tempo soou. Eram cerca das cinco e meia.
Não era de fiar aquela velha máquina de contar o silêncio e o acordar do dia.
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R.D.
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