terça-feira, 28 de agosto de 2012

tributo a Eugénio de Andrade


PASSO POR NÓS SEM NOS VER

 

Passo por nós sem nos ver

Distraído como um animal assustado;

Se me olhas    ignoro,

Se me conheces  duvido,

Se me olho ao espelho não estremeço

Com secos pensamentos repressores

Caídos aos meus pés    empobrecido.

 

                                                      28 de agosto de 2012
                                                        Quinta do Rouxinol

                                                         

segunda-feira, 27 de agosto de 2012

do jornalzinho de departamento


O DIÁLOGO
 

A tão conhecida expressão “via do diálogo” abundante no discurso politizado e de mediação, em geral, continua, de facto, a ser a melhor via de entendimento para qualquer fim. Todavia, à medida que o tempo passa e vamos sendo um somatório de experiências e vivências, constatamos que o diálogo requer um ingrediente indispensável, o discernimento, ou seja, a visão esclarecida que reflete a capacidade de descodificação das ideias e sentimentos mais ou menos profundos que vamos construindo sobre nós e o mundo à nossa volta, possível com um suficiente distanciamento emocional do falante com vista a uma comunicação que se quer bem sucedida porque contém a inspiração e a clareza necessárias.

Assim, o diálogo, no seu sentido genuíno de interação voluntária e espontânea, deve ser engrandecido por uma consciência de aprendizagem adequada, constante e aperfeiçoada, de compreensão do valor do conhecimento e do esclarecimento nas relações humanas, prevenindo quaisquer mal-entendidos ou conflitos devastadores para o indivíduo e para a vida comunitária, num permanente desafio que nos prenda à vida.
                                                                                     Olívia Campos (quando eu lecionava DPS)

                                                                   (Extraído do jornalzinho do departamento de Ciências Humanas da E.S.M.M., nº 2, de 19 de julho de 2000, p.3)
 

sexta-feira, 24 de agosto de 2012

RITOS
 
Ritos sagrados acorrem-te ao ouvido
melodias e cantares elevados
sons teclados e vibrados
em breve indicação celeste.
 
A cada encapelado olhar portentoso
fremem cúpulas generosas retumbantes
acordam amorosas e sofridas condições
e esbeltos seios de santas douram os painéis.
 
- Vem... - e soltas-me os dedos como cabelos
num gesto de reencontro e reconciliação
tocas no meu rosto ténue ainda perfumado
a pele de canela e madressilva retocada:
- Vês intermitentes coloridos do ciclo agreste
sobre defuntos seres pedregosos?
 
Uma nesga de silêncio é convite à quietude.
 
- Olha... - e juntos queremos ver
para além da morte e do sofrimento
os rios de estrelas de um brilhante lilás
descendo as naves até aos altares circulares
que correm pelo nosso corpo transformado
em ungido de bênçãos confluentes
uno de gotas quentes e anéis, luzes
e pequenos pássaros de cor púrpura
gerados na foz do tempo livre do pensamento
oferecidos naquela Hora intensa do amanhecer
ao Rito grandioso
imparável do Acontecer.

                                      outubro/2009