terça-feira, 29 de novembro de 2016

Como desenhar a guitarra portuguesa?

«Cada olhar é um olhar de estudo.» William Turner.
A guitarra portuguesa é um dos instrumentos musicais mais desenhados em Portugal. Não é surpresa para ninguém.
A maneira mais prática de incluir a sua imagem é fotografá-la, naturalmente. Como habitualmente acontece nos cartazes a anunciar um espetáculo de fados.
Contudo, os pintores gostam de pintá-la. Os desenhadores de desenhá-la.



Não é um instrumento fácil de reproduzir no papel ou na tela. Sobretudo nas suas distintas partes (de cima para baixo), a saber: a voluta, cravelha ou carrilhão (também chamada mecânica ou tarracha), cabeça ou pá (também chamada de paleta ou mão), pestana, braço, traste, escala, boca, ilharga ou faixa, roseta ou mosaico, tampo e osso ou rastilho.



A voluta, no topo da guitarra, é desenhada ou simplificada de acordo com a posição que se desenha a guitarra portuguesa, já que esta sobressai por detrás das cravelhas, também habitualmente simplificadas no desenho ou pintura.
Stuart de Carvalhais, no seu famoso desenho da Severa, põe o guitarrista a tocar uma guitarra portuguesa cuja boca aparece sensivelmente a meio do tampo.  




 Até na construção dos instrumentos, os guitarreiros e violeiros, neste caso, apesar da obediência rigorosa às partes do objeto, sentem que têm alguma margem de manobra na construção dos seus instrumentos. Por vezes, gostam mesmo de introduzir uma diferença como marca pessoal. 
Já repararam na guitarra que o António Zambujo tem tocado? Tem a boca chegada ao braço como as guitarras portuguesas. Só pode ser uma homenagem ao fado.
 A roseta ou mosaico, que é a folhinha decorativa no tampo da guitarra portuguesa, normalmente aparece do lado direito. Mas às vezes aparece do lado esquerdo...
 Não é fácil desenhar a rigor o símbolo do fado (embora a viola de fado nunca deva ser dispensada desse símbolo); sobretudo a parte superior de uma guitarra portuguesa. Mas é isso que o artista pretende? Desenhar cada cravelha, o número certo de cravelhas? Mais a cabeça ou pá tal e qual?
Quem gosta do desenho realista, dá muito valor a uma guitarra rigorosamente bem desenhada. Revela domínio e pesquisa.
Mas o desenho ou a pintura não se substitui à fotografia.
Quando o artista mostra que teve o cuidado de conhecer e reproduzir todos os contornos de um instrumento (seja instrumento ou outro objeto qualquer, claro), isso é apreciado por quem observa.
Mas cada vez mais a arte pictórica tendencialmente prima pela libertação do artista à fidelização com o comum e com a mimesis.



O domínio da técnica e da arte é fundamental para, a seu tempo, cada obreiro abrir asas e voar pelo mundo do som, do traço, da cor e do sentimento.

Autobiografia (página 1)

Da esquerda para a diretia: eu, o meu pai, a minha mãe,
o meu irmão João ao colo e a minha irmã.
AUTOBIOGRAFIA (PÁGINA 1)

As pessoas morrem e o mundo fica, seja este ou outro, com a forma ou a composição de matéria/energia que tiver, com ou sem existência humana. Parece que, de facto, continuamos, mas isso é outra história para outro projeto...
Seja como for, escrever é uma forma de nos sentirmos vivos. Há outras, claro. (Aliás, fiz um trabalho de investigação há pouco tempo sobre essa temática…)
Hoje começo qualquer coisa que se quer parecer com uma autobiografia. Tenho um ou outro diário escrito antigo, mas esta ideia é uma nova oportunidade de organizar na minha mente, como a memória consegue atualmente, os momentos que, de outra forma, iria recuperar num esforço de memória com pequenas adaptações próprias da própria seleção memorialística circunscrita no fio do tempo diacrónico e afetivo.
Não sei se são leitores do  Jornal de Letras, mas este normalmente ocupa a última página do seu periódico com uma breve autobiografia. À partida, de alguém que se distingue em alguma área artística ou de conhecimento.
Não sei se alguma vez me distingui em alguma coisa, mas também estou apenas aqui a fazer um exercício que gosto de ver nos outros autores.
Quando era menina e moça, ninguém me levou cedo da casa dos meus pais. Ou melhor, até levou, mas na idade própria: saí como tradicionalmente as raparigas da minha idade deviam sair: para casar. Acho que aconteceu desse modo como podia ter sido de outro qualquer (ou não...).
Querem que comece do princípio? Eu nasci em casa dos meus pais, em Lisboa.
O clã familiar feminino da parte da minha mãe encarregava-se de chamar a parteira, já conhecida, dado que a progenitora pariu cinco filhos em casa. Só o último é que nasceu na Maternidade Alfredo da Costa, devido à idade da minha mãe na altura. O caçula foi um bebé que nasceu pouco mais de 9 meses depois do nascimento do penúltimo. Éramos só duas raparigas e, por isso, estávamos ansiando que nascesse, para equilibrar, uma menina. Oh que pena! Mas nasceu um belo rapaz, o Alexandre.
Na gravidez em que fui gerada, aconteceu o mesmo (parece que acontece com frequência): passado pouco tempo de a minha mãe dar à luz a minha irmã, engravidou e o bebé que nasceu a seguir fui eu.
Claro que não me lembro de ter nascido. Sei que não chorei e comecei logo a apanhar assim que vim a este mundo.
Fui batizada na igreja de São Pedro em Alcântara, mas as fotos estragaram-se todas (versão oficial)…
O meu pai passava muito tempo embarcado e devido à religiosidade da família da minha mãe, os batismos eram simples cerimónias, logo que possível realizavam-se (não fosse acontecer alguma situação inesperada). Nessa altura, a taxa de mortalidade infantil era alta, sobretudo de nados do sexo masculino.
A minha mãe estava com défice de cálcio, enquanto eu era feto. Assim, nasci franzina e com algumas fragilidades, que sempre fui superando com a minha fascinação pela vida. Sentava-me ao lado da minha mãe quando ela estava a dar de biberão aos meus irmãos mais novos. Eles raramente bebiam tudo. Às vezes, o resto tocava-me. E como eu gostava do sabor do leite em pó daquelas latas enormes da Nestlé!
Não sei que idade teria nessa altura, mas creio que andaria pelos meus três anitos, que é a diferença de idade do meu irmão João.
Também me lembro de estar deitada na cama de grades no quarto dos meus pais, com um resguardo azul, a ver as sombras que o candeeiro de teto fazia nas paredes. Gostava daquele efeito. Todos os bebés gostam de olhar as sombras que mexem. Mas eu nessa altura já me punha a tentar perceber formas familiares que ora se faziam ora se desfaziam com o movimento do candeeiro (sempre que alguém se chegava à minha cama, batia ao de leve no abat-jour do candeeiro antigo em forma de cálice de flor).
A minha mãe punha-me a ouvir um rádio grande que havia na sala e eu, que mal conseguia dançar, mas não parava. Só acalmava quando o sono dava forte e eu caía literalmente para trás. Fazia um estrondo no soalho que assustava toda a gente. Gemia com a dor, mas ficava no chão a dormir, nas tábuas a cheirarem à madeira da natureza.
Gostava muito de ter irmãos. Eles eram os meus heróis, pois tinham sempre mais altura e força do que eu. Eu dizia que não gostava de ser rapaz porque eles eram mais bruscos a brincar e não podiam usar brincos. Vejam só! Lá em casa, as mulheres eram furadas na orelha logo de muito tenrinhas. A minha mãe sofria muito com os brincos belos, mas pesados que era pressionada a usar nas orelhas que o meu pai trazia das Ilhas Canárias.
Quando estava calor, íamos para a varanda da sala, virada para a rua de Alcântara, e púnhamos as pernocas de fora do gradeamento verde garrafa (mas só na companhia dos irmãos mais velhos). Olhava à direita e via o cemitério dos prazeres; as árvores pontiagudas faziam-me lembrar os pinheiros da Vide. Então perguntava a toda a gente quando é que íamos à Vide, visto que era muito perto…

Também nos entretínhamos com os livros da escola que havia lá em casa, do meu irmão mais velho, à socapa. Mas o que eu queria era começar a ter os meus materiais da escola e de poder dizer que também tinha tarefas diárias escolares. Queria crescer como os mais velhos. E trabalhava muito como se já tivesse obrigações. Não sabia escrever, mas fazia desenhos. Os meus pais elogiavam-me os desenhos (à exceção dos momentos do telejornal que eram sagrados para o meu pai – nada de falas! As poucas vezes que tentei, levei uma corrida em osso, como se dizia lá em casa). Ainda não existiam tantos canais informativos!

domingo, 27 de novembro de 2016

Poema ao mar

Nave-de-mar

Do rio ao mar alto
Do mar alto ao horizonte
Caravela sonhadora
Marinheiros de fronte
Encapelada na onda
E com ventos bisonte
Navega no longe
E olhos de ronda.

Do rio ao mar alto
Do mar alto ao horizonte
Caravela sonhadora
Marinheiros de fronte
Com rosário de ponta
Clamam a Deus do monte
Menos chuvadas em fonte
Nave-de-mar que conte.

Do rio ao mar alto

Do mar alto ao horizonte
Caravela sonhadora
Marinheiros de fronte
Barca bela senhora
Fartas águas em ponte
Desta alma que conte
Saudade sem-fim, donde?


27-11-2016

Rosa Maria Duarte

sexta-feira, 25 de novembro de 2016

quinta-feira, 24 de novembro de 2016

O meu contributo para o projeto da FCSH+Lisboa - Conhecer e Contar a Cidade. Quadro a óleo para oferecer.

Segunda-feira, dia 28 de novembro, presença digital, com a plataforma FCSH +Lisboa - Conhecer e Contar a Cidade. A plataforma conta já com mais de 150 ‘entradas’ sobre a cidade, três roteiros e cerca de 120 locais/pontos de interesse referenciados no mapa do site. Contará ainda com perto de 50 entradas na aplicação Foursquare nos primeiros dias do seu lançamento. 

No dia de lançamento e tirando partido dos smartphones ou tablets, será possível ler in loco a entrada sobre o mural da FCSH/NOVA alusivo ao 25 de abril de 1974. Haverá uma concentração em frente ao mural, às 14h, para uma ‘leitura locativa’ de estreia do website e realização de fotografia de grupo.  

No feriado de 1 de dezembro gostaríamos de contar com a sua presença na visita conjunta que vamos fazer, seguindo um dos Roteiros já disponíveis: Descendo as Avenidas Novas

O roteiro terá início às 14h30 junto à Maternidade Alfredo da Costa e terminará pelas 16h00 junto ao mural da FCSH/NOVA, seguido de um momento de convívio no edifício ID. A participação é gratuita e implica a utilização de um smartphone ou tablet com ligação à Internet. Inscrições até 29 de novembro, às 17h, através de formulário.

(esta é a informação oficial da Instituição)


Conhecer e Contar a Cidade
Rosa Maria Duarte
Óleo s/tela
70x80















quarta-feira, 23 de novembro de 2016

Segue em frente a imposição do faz de conta? Não aconselhável...

Ah, amiga de ti, amizade good, nada de likes?

Segues o faz de conta de que não te conheces
Segues o faz de conta de que não podes falar
Segues o faz de conta de que tu me és indiferente
Segues o faz de conta que o teu sorriso é demais
Segues o faz de conta de que ninguém to impede?

Vais-te insurgir ou quê e vais vestir outra atitude?

Não estás careca da parvoeira de ser invisível
De alimentar o disparate do disfarce forçado
De ter costas largas para salvar outros mundos
sentidos e imaginados, fabricados na insegurança?

Tens mais perdão aos outros do que ao teu olhar?
Não te sentes tapada, usada, repatriada de ti?
Mesmo sabendo que sabes que todos sabem
Que tu sabes que gostas de ti, mais ainda que nunca
Reforçada pelo amor in com o coração out?

Vai continuar o faz de conta? Algo muda?

Everyone likes you. Lê os olhares de apreço.

Ok, continua contigo: mannequin challenge!




«Fado do fado» de Barata Dias (um dos livros que ando a ler)

Trata-se de uma narrativa na 1ª pessoa, contada pelo jovem guitarrista chamado Ventura (nome auspicioso), que partilha com o leitor as suas vivências enriquecedoras no mundo fadista.

Um retrato de amantes do fado, cheio de viveza no quotidiano português, realista e de interesse etnográfico.

Estou a gostar.