«A EDUCAÇÃO JÁ NÃO É A
MINHA PAIXÃO»
Hoje em dia, as declarações de amor são cada vez mais raras. Chegam
despudoradamente a converter-se em declarações de desamor… É que a educação não
é um investimento imediato. E preciso é arrecadar dinheiro já e agora…
«A austeridade é agora a minha paixão» tresle-se em cada
declaração política na conjuntura atual portuguesa.
Fazem-se declarações de dívidas, sem amor pelo próximo, porque
as palavras amorosas, ainda que retóricas, assustam. Há o medo do fracasso
internacional, mas não há o medo da deslealdade e do abuso, até da parte daqueles
em quem se queria confiar e respeitar. Já se noticia que a austeridade tem as
suas vantagens: mantém as famílias mais unidas, mais em casa, dividindo o pão, o
que resulta em menos divórcios…
Fatidicamente, as belas cartas de amor deixam de ser lidas e
consideradas ridículas: definham de vez no esquecimento e no desprezo. A distração
com as contas bancárias virou costas à paixão pelo bem comum e aos sonhos
partilhados.
A atitude agrava-se quando se trata da suposta proteção à Educação
nacional, materializada por sucessivas declarações de desamor. Gestos e
palavras que têm fragilizado o valor da confiança no futuro da aprendizagem
escolar, cada vez mais preterido a favor dos valores da bolsa e do lucro.
O espectro da velha paixão pelo dinheiro a assombrar a mais
antiga preocupação civil que é a Educação. Consagrada como gratuita e
universal. Ou será que essa preocupação nunca chegou a ser paixão real e correspondida?
Não há seres humanos perfeitos. Em alguns títulos de filmes
ou livros, e pouco mais. É verdade que não há professores perfeitos, nem alunos
perfeitos. Muito menos ministros perfeitos ou sistemas perfeitos.
Mas as Causas podem devolver o norte e a confiança (quando
não são pretextos extremistas ou manobras populistas) e contribuir para o clima
social desejável a todos. Quem não sabe que a educação é o berço cultural e a ferramenta
genuína para a identidade nacional? Mas infelizmente há sempre quem pense que a
sua qualidade de vida é um condomínio fechado, a salvo dos todos os assaltos
monetários, civilizacionais, emocionais…
Agora nem as escolas mais seguras e organizadas conseguem
assegurar a estabilidade da comunidade educativa do ensino público português se
anualmente veem reduzidos os seus direitos e as suas condições de trabalho.
A frase “a Educação é a minha paixão” deixou de ser ridícula:
desgastou-se pelo uso abusivo e, sobretudo, pelas insuficientes dádivas
efetivas na consumação dessa promessa sentimental adiada.
Os conturbados tempos atuais, que exigem uma maior convicção
nos valores educativos, já não conseguem vislumbrar os ténues sinais da velha sensibilidade
saudosista que se dizia protetora do ensino público, retoricamente fundamentada
na democracia e na alma afoita do coração luso. O fado da árdua conquista.
É pena que as ridículas declarações de amor de antigamente se
pareçam hoje com as secas declarações dos divórcios, sem comum acordo, por
traição consumada com os contratos do novo regime jurídico sem restrições para
o ensino privado com o Estado, mortalmente dilacerada pelos cortes sucessivos
nos salários dos funcionários públicos, nos subsídios de alimentação e pelo exponencial
desemprego, quer dos professores, quer dos alunos que se veem desprotegidos e votados
à frustração da precariedade e da emigração.
Não é preciso ser-se filósofo para se pensar que a sociedade deve
ter um sistema educativo justo e responsável. E são urgentes as intenções
pragmáticas que compreendam e respondam às necessidades de todos os jovens e das
suas escolas, com vista a uma ação social saudável e pedagógica de sucesso.
As extemporâneas declarações de amor ridículas, ainda que moribundas,
parecem atingir níveis de ridicularidade ao ponto de haver quem mande condicionar
o trânsito rodoviário e aéreo no período da realização das provas de acesso ao
ensino superior, como aconteceu há dias na Coreia do Sul. Até a bolsa abriu
mais tarde. Decididamente, não reivindicamos tanto….
Laranjeiro, 13 de novembro de 2013
Rosa Maria Duarte
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