O Fado, esse grande embaixador |
Quem diria que o Fado, nascido numa manjedoura rufia, viesse a ser o grande embaixador da língua portuguesa, que já vai ao Brasil, ao Japão e a Macau, à Polónia, ao Reino Unido, à Alemanha e aos Estados Unidos, à Austrália e a Espanha, à África do Sul e à Nova Zelândia… É o novo Conquistador da Modernidade. Ouvido, cantado, tocado, chorado, e há quem diga que até pode ser dançado. Pois é… Cada vez mais falado e entoado. Quiçá um dos mais importantes cônsules do novo 5º Império, Valete, Frates, tão profetizado pelos nossos dois maiores representantes da língua portuguesa: Padre António Vieira e Fernando Pessoa.
"Há uma música do povo" escreveu Fernando Pessoa no Diário de Notícias, em 1929, ao referir-se ao fado, que "não é alegre nem triste"."Domou-o a alma portuguesa, quando não existia, e desejava tudo sem ter força para o desejar” e acrescentou, intelectualizando a sua alegria de ser português: "no fado, os Deuses regressam legítimos e longínquos". A este propósito, de aplaudir mais uma edição comemorativa pessoana, desta vez o Pessoa com fado, não fosse ele a alma portuguesa. Poemas seus fadados ao reportório dos grandes fadistas que os cantam. Para encanto de todos.
A história do fado é a nossa sina: de uma beleza antiga em apreciação reincidente, matizes intercontinentais de origens universais, humildade pobre na grandeza nativa, gratidão poética em vibratos plangentes.
É o fado o porta-voz cultural oficial, à luz do dia. Embora continue renitente na penumbra do silêncio expectante e comovido. Noite dentro, beijado por mar ou por terra, viageiro dos quatro cantos do mundo, a sua meninice e juventude viveu-as na nobre pátria lusa, de quem hoje tanto se orgulha e ama com verdade, sem ciúmes de música madura, mas sempre pronto a namoriscar, com alguma (in)decência, o vasto mundo do som: o jazz, o pop, o flamenco… Até já bateu à porta das escolas públicas (ainda que não faça por enquanto dos residentes programas…).
Fora portas, na pátria de acolhimento de Camões, por exemplo, os macaenses não se limitam a ensinar o português. Por lá vão cantando o que julgam compreender do fado. Anseiam por visitar Portugal e ver de perto quanto vale um português dos verdadeiros, mais a sua nobre pedagogia de ensinar a língua materna, bem como a não materna, pois tantos cidadãos Portugal tem do mundo. Camões cantava o eterno que acoplava à espontânea plasticidade poética e, segundo consta, também se aventurava a dedilhar a viola de mão da época a embalar as casadoiras meninas com os seus sonetos de amor.
Ora, não é que eles aí estão?!, os macaenses, no dia seis de fevereiro, no Laranjeiro, na escola secundária Professor Ruy Luís Gomes, para ouvir e entoar a língua portuguesa, com sotaque cantonense ou mandarim, sem sequer se privarem da suculenta degustação da poesia de Fernando Pessoa na genuína língua do super Camões. E que há tantos anos orgulhosamente é revisitada pelos nossos ilustres alunos nas aulas de Português.
Estes orientais professores, pelos vistos, também não dispensam um final apoteótico como um bom fadinho oferecido nas margens do rio lusíada, que de tão inspirador e fraterno se tornou morada das ninfas: o mítico Tejo dos descobrimentos. Não fosse o seu majestoso nome, Tejo, grandiloquente e épico na sua humilde origem castelhana, que carrega a inocência semântica peninsular de quem joga as suas parcas moedas à faca que teima em fincar o chão. É a secular escola fadista intemporal.
|
Rosa Duarte - 05-02-2014 09:36 http://www.setubalnarede.pt/content/index.php?action=articlesDetailFo&rec=20949 |
quinta-feira, 6 de fevereiro de 2014
crónica publicada no «Setúbal na Rede»
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário