A Minha Região
Rosa Maria Duarte
Óleo s/tela
73x54
O homem deve ser superado
Testar os limites humanos é uma constante diária na vida de
cada um. Arriscar para sobreviver e ganhar. A perícia está em saber calcular cada
avanço para o cenário seguinte. E dosear o risco é a dúvida que persiste e sustenta
a adrenalina. Um pé atrás do outro. Sai um em falso e o outro tem que ser um
super-pé ou então sujeita-se…
Um percurso de vida experiente é uma mais-valia. Mas o tempo também
cristaliza regras e faz esquecer o valor das exceções, que muitas vezes são a chave
do desconhecido.
Abrir a porta do inédito é um ato heroico. E ser-se apanhado
desprevenido pela dor pode significar o preço elevado de abdicar da velha e
empoeirada forma de se ser homem conformado e domesticado para alcançar uma
nova força dentro de si próprio. “O homem é uma corda, atada entre o
animal e o super-homem – uma corda sobre o abismo” (Nietzsche, Assim Falou Zaratustra, p. 13).
Dos fracos não reza a história. Homem morto, homem posto. O
mundo continua a avançar a cada passo pelas pernas de cada indivíduo que passa.
E as baixas humanas fazem parte dos ciclos da história da humanidade. O que tem
que ser feito, tem muita força.
Quase sempre os caminhos são abertos pelos passos mais jovens
que não se detêm nos riscos, mas que dão a própria vida pela conquista e pela
descoberta.
Contudo, a consciência do risco e das consequências não diminui
a grandeza dos atos. Pelo contrário. O filósofo e o artista sabem-no. “Eu
vos digo: é preciso ter ainda o caos dentro de si, para poder dar à luz uma
estrela dançante. Eu vos digo: tendes ainda o caos dentro de vós” (Nietzsche, Idem, p. 18).
Os pensadores e os artistas são potenciais mentores do futuro
da humanidade.
E cada professor é um Zaratustra à procura da estrela em cada
um dos seus pupilos. Se não fosse a profissão de professor ser mais a arte da
paciência do que a da sabedoria («vira-te prá frente e está calado»), provavelmente já o ser humano,
escravo do seu tempo, estaria mais próximo de um estádio de vida não
circunscrito unicamente à sua própria preservação.
É que para o
humano ir para além de si mesmo precisa de ultrapassar as ideias asfixiantes e
os conceitos que o aprisionam. O que pode o homem fazer atualmente por si? Claro
que muito… Mas chegará o dia em que o melhor será ultrapassar-se, de tão cansado
que estará da massificação. Então haverá mais espaço para o ato criativo. E a
diferença será uma força acrescida.
Mas o muito a fazer é mesmo
muito.
«Dead woman
can’t vote» foram palavras de ordem que se ouviram e leram há dias via
comunicação social num protesto contra os casos de violência doméstica, a propósito
do filme «Suffragette» no Festival de Cinema de Londres. É uma prova de que é ainda
tempo de lutar pela preservação da dignidade individual neste século XXI na
velha Europa, em que há quem ignore a urgência da condição existencial condigna.
“Grande, no homem, é ele ser uma ponte e não
um objetivo: o que pode ser amado, no homem, é ser ele uma passagem e um
declínio” (Nietzsche, Idem, p. 13).
Parabéns aos
“construtores de pessoas” por mais uma comemoração do Dia Mundial do Professor (o
recente feriado caído do 5 de outubro).
Rosa Maria Duarte
«Diário da Região» de 22 de outubro de 2015
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