MEIA HORA DA VERDADE (AS OUTRAS MEIAS
FICAM PARA DEPOIS)
A verdade é uma necessidade que muitas vezes se adia. Por
várias razões.
Uma delas é deixar que os outros a descubram. Como nos filmes
policiais. Quem parece a vítima é o criminoso e vice-versa.
Hoje vou tentar desvendar um pouco a minha verdade que tem
levado muito tempo a ser detetada e compreendida. Só um pouco, claro está,
porque envolve algumas situações delicadas…
Porque é que não o fiz antes?
Porque estava suficientemente embrenhada no meu trabalho de
investigação. Todo o minuto e pingo de energia contavam (já estou na outra
fase…)
O que eu gostaria, neste primeiro capítulo, que ficasse
minimamente esclarecido é que não quero chamar à pedra ninguém nem devolver as amáveis
cortesias. Apenas me decidi pela via do diálogo (espero…).
Como muitos sabem, sou professora faz 30 anos. Comecei em
1985 (no ano em que me casei).
Posso dizer que sempre tive uma boa relação com os meus
alunos. Sou oriunda de uma família numerosa e fui criada com dois irmãos mais
velhos e três mais novos. Uma família tendencialmente masculina (daí também a
minha natural familiaridade com o temperamento masculino). Atualmente, no meu
agregado familiar sou a única mulher.
Sempre fui de convicções, mas aprendi com o tempo a moderar-me
e dar mais espaço ao benefício da dúvida. Hoje considero-me uma razoável
pedagoga. Acho que devemos dar o nosso melhor quando acreditamos no que
fazemos.
Se sou mais ou menos parecida com a maioria das pessoas, é
uma resposta que ainda não estou certa dela. Afinal não somos todos únicos?
Claro que há pessoas que têm mais afinidades umas com as outras…
Mas eu não sou, nem nunca tive excesso de autoestima. Em
Psicologia não existe excesso de autoestima. Apenas arrogância ou complexo de
superioridade. De que nunca sofri. E às vezes é de grande crueldade quando
pessoas, jovens e crianças, ao tentarem superar as suas inseguranças com uma
atitude mais assertiva, os outros atacarem-nas, por vezes de forma brutal, a
querer deitar por terra esse esforço.
Um curso intensivo de Psicologia devia ser obrigatório, com
uma sábia e adequada metodologia em função da idade e do nível de ensino, ao
longo da vida para cada ser humano. Não uma Psicologia de bolso, mas a séria
Psicologia que se encontra em constante desenvolvimento e fascinante descoberta.
Como é que é possível que indivíduos com talento e até de
sucesso sofram inversamente agressões afetivas e psicológicas por parte dos
seus pares? E os que têm pouco também sofrem, claro.
Mas os que o desenvolvem, é surpreendente (pelo menos aparentemente),
porque têm algo para oferecer aos outros. O que é que se passa, afinal?
Todos sabemos que a máxima «a felicidades dos outros é a
minha própria felicidade» é só para muito poucos.
Quando José Cardoso Pires ganhou o prémio Pessoa, de imediato telefonou ao seu amigo Júlio Pomar e disse-lhe mais ou
menos isto: - ganhaste o prémio, amigo (ver Autobiografia
de José Cardoso Pires de Inês Pedrosa).
Não se pode exigir que o simples mortal não sinta a pequenez
de sentimentos menores. Até (ou infelizmente sobretudo…) perante as pequenas
felicidades dos mais próximos.
A ideia seria partilhar e estender o mais possível ao
coletivo o bom que a vida vai proporcionando…mas nem sempre é assim. Quantas
vezes por medo e por despeito. Da parte do próprio e, quantas vezes, da parte
de quem reconhece silenciosamente o valor de alguém, mas desenterra falsas
razões para não o fazer!
E a Humanidade leva tanto tempo a aproveitar os seus próprios
recursos. Sobretudo os humanos. Quantos talentos, ao longo da sua história, não
foram quase integralmente desperdiçados? Digo quase porque acredito que a vida
tem um propósito e algo de cada um tem que reverter em benefício do presente
para o futuro. Nem que seja algo muito insípido e mínimo…
Nunca se questionaram porque é que as pessoas, como as
ligadas ao cinema, à música e a outras áreas do espetáculo e do saber, que têm
tudo a seu favor para serem felizes e nunca o foram (às vezes apressam o seu
fim)?
As razões são múltiplas e circunscritas a cada caso. Mas que
faz pensar, a mim faz!
Há dias via um documentário com os meus alunos sobre a vida e
obra de Eça de Queirós e eles ficaram muito admirados com o facto de a filha do
célebre escritor, mesmo que em Paris (ou especialmente por isso), por altura do
seu falecimento, tenha ficado estupefacta com a quantidade de gente que acorreu
às cerimónias fúnebres em honra de seu pai. Segundo o próprio testemunho, esta jovem
que era na altura só conseguiu justificar o fenómeno público com o tipo de
profissão que o seu pai exercia de cônsul (que afinal sempre fora e nunca tivera este apoio público).
Há algum tempo atrás, uma colega minha dizia-me que as
pessoas que se distinguem pela sua obra, nunca deveriam de ser publicamente
reconhecidas antes da sua morte.
Será possível esconder a vida toda esse reconhecimento ao
próprio, ou o grau e suas variações de imagem pública em tempo real?
Será legítimo e mesmo humano fazê-lo?
Será que os outros (já não falo do próprio) beneficiam mais
dessa obra assim ou da obra que poderia ser feita com apoio e não são proporcionadas condições para isso?
Ainda mais: será legítimo fabricar uma imagem social de
desinteresse e fraca qualidade, imagem essa trabalhosa para ser por vezes exclusiva para o próprio, só para
que este não se envaideça (se partirmos desde já desse pressuposto)?
Parece que somos em boa parte o que os outros pensam de nós. Ou
mesmo muito. Mas a inteligência humana consegue melhor, ainda que não o
confesse por tática pessoal ou incrível respeito por essa vontade. José Régio
não foi nisso e manifesta-o bem no seu «Cântico Negro». Podiam considerá-lo
arrogante ou obstinado, mas ele fez o seu próprio caminho. Talvez num grau de
solidão evitável…ou não…
Agora o castigo e a distorção da verdade que se faz a um ser
humano devem ser denunciados e dadas respostas em conformidade com a realidade
dos factos.
Nós não temos o direito de roubar a felicidade uns aos
outros. De maltratar quem vive para o seu propósito de vida. Porque o mau estar
de um é o mau estar de todos. É o que eu tento passar aos meus alunos.
Quem apoia, a seu tempo, é reconhecido por quem é ajudado.
Cada um tem o seu timing para avaliar
as situações e os carateres. Mas é bom colher frutos e não alimentar remorsos.
Todos temos talentos e é nossa obrigação pô-los ao serviço do
coletivo. Não perder tempo a não deixar fazer, mas ganhá-lo fazendo também.
Cada um com as suas qualidades. É essa riqueza que nos comove. Somos tantos,
alguns tão parecidos como os gémeos verdadeiros, e somos sempre diferentes.
Que há chico espertismo, claro que há. Mas a seu tempo tudo
se revela. Viver na desconfiança e no medo de dar um abraço e agradecer é um
existir desperdiçado.
Eu recuso-me a tal.
Se desistirmos, então o homem é um projeto falhado. Se somos
suficientemente humildes para estarmos juntos, há que trabalhar honestamente
para isso.
Para terminar esta minha primeira (e para já única) revelação
pública do meu caso (que dava um folhetim…com várias edições), prometo aos meus
amigos (aos que me querem ajudar, embora com certas dificuldades…) que
continuarei arduamente a cumprir a minha missão que é dar o que tenho melhor em
mim.
Não acham que deveria existir para além das instituições que
já conhecemos (ou sendo mesmo da responsabilidade de uma dessas instituições) um
número de acões efetivas no terreno no sentido de preservar de forma mais
próxima a integridade moral, social e afetiva dos artistas e dos criadores em
geral perante as variadas situações que se lhe deparam, quer perante os seus
pares, quer perante a sociedade em geral?
Porque não… ver ou ouvir o que fazemos nas melhores condições?
Contrariar para desmotivar pode ser uma arma de dois canos inversos. E as
caretas são para as caricas velhas e riscadas. BAHH!
Vai um tirinho?
Até à próxima.
7 de abril de 2015
Rosa Maria Duarte
Sem comentários:
Enviar um comentário