É bom “ouvir” Jorge Luís Borges a historiar sobre a
eternidade. No seu livro História da
Eternidade. Imagem feita com substância do tempo. O arquétipo que
compreende e exalta todos os outros arquétipos: a razão, a necessidade, a ordem,
a desordem...
O Universo requer a eternidade. Sabe-se que a eternidade é
uma invenção copiosa, não concebível, como também o é o humilde tempo
sucessivo. Negar a eternidade não é menos incrível do que imaginar a sua
existência.
A nossa identidade reside na nossa memória. Logo, a anulação
desta faculdade implica a idiotia. José Cardoso Pires perdeu a memória, mas ao manter
parte da consciência de si, sentia-se um idiota quando o tratavam como uma
criança. O certo é que olhava para a escova de dentes e não se lembrava para
que servia. Talvez para se pentear…
Santo Agostinho falava sobre o tempo e exemplificava: “Antes
de começar, o poema está na minha antecipação; assim que o acabei, [está] na
minha memória […]”. O valor da memória como um livro humano a estimar para perdurar.
Por isso, sentir a morte é sentir a ausência da eternidade.
Os momentos humanos não são infinitos. Então a arte embeleza a ideia da morte
pela imagem figurada, metaforizada: o sono da terra, a noite fria, a última
sesta, o velho cadeirão de baloiço… O rouxinol devorador do tempo.
Nietzsche sentiu imortal o instante em que engendrou o Eterno
regresso.
Antes de Nietzsche, a imortalidade pessoal era um simples
equívoco de esperanças, era um projeto confuso. Nietzsche propõe-na como um
dever e confere-lhe a lucidez de uma insónia.
Claro que o Eterno Retorno foi, lucidamente, apresentado como
a doutrina da repetição circular provável ou possível. Mas como a imagem de uma
mera possibilidade nos pode fazer estremecer e corrigir! Os erros e os castigos
repetidos…
Houve quem procurasse destruir o fundamento desta tese de
Nietzsche, como Georg Cantor, com a afirmação da perfeita infinidade do número
de pontos no Universo.
Porém, o Eterno Retorno é um conceito não acabado em vida pelo
próprio Nietzsche.
Com o Eterno
Retorno, Nietzsche questiona a ordem das coisas. Indica um mundo não feito
de polos opostos e inconciliáveis, mas de faces complementares de uma mesma, múltipla,
mas única, realidade. Logo, bem e mal, angústia e prazer são instâncias
complementares da realidade, instâncias que se alternam eternamente. Como a
realidade não tem objetivo, ou finalidade (pois se tivesse já a teria
alcançado), a alternância nunca finda. Ou seja, considerando-se o tempo
infinito e as combinações de forças em conflito que formam cada instante finitas,
em algum momento futuro tudo se repetirá infinitas vezes. Assim, vemos sempre
os mesmos factos retornarem indefinidamente.
Nos textos
de Nietzsche sobre a História, vemos que sua noção do Tempo não é cíclica. Há,
contudo, leis naturais que se manifestam de forma coordenada e coexistencial.
“Vou arder, mas isso não passa de um episódio.
Depois continuaremos a discutir na eternidade.” Palavras de Miguel Servet,
filósofo aragonês renascentista, dirigidas aos juízes ao ser condenado à
fogueira por heresia.
Corroios, 20 de março de 2013
Rosa Duarte
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