quarta-feira, 30 de maio de 2018

Dá-me apenas o R desse teu nome de mulher

Repara: nascemos no mesmo mundo.
Gritámos juntos o nascermos nus
os sermos seres aflitos lado a lado.
Gritámos quase palavras de ordem.
Viver. Eram tantas boquinhas a gritar.
Não nos víamos, nós recém-nascidos,
queríamos de certeza qualquer coisa.

Depois soltámos mexidos anões a correr
agitar cheiinhos braços a rodar a pulular
a baixar e levantar pernas cambalhotas
caracóis loirinhos a rolar a roçar o chão
e gritinhos mais gritos sons de conquista
tontinhos a ver tudo à roda volta não volta
a gritar uns p'los outros sons livres de cor.

Gritos de nome de gente talvez bonitos a valer
que tão mal pronunciava sem saber dizer os rr.

Estou aqui a pensar: e se me desses os rr
desse nome lindo de criança que eu não consigo
ainda pronunciar direito, de tal doçura e magia?
Já não és criança? Não interessa, eu também não.
Dá-me apenas o R desse teu nome de mulher.

Rosa Maria Duarte





Sem comentários:

Enviar um comentário