Júlio Pomar
É bom sabermos um pouco uns dos outros. Sentirmo-nos ligados. Não indiferentes. Não invisíveis. Ou indecifráveis. Irreconhecíveis.
Júlio Pomar? Sobre Júlio Pomar diria talvez um pouco menos daquilo que já muitos sabem. Da sua vida. Da sua obra. Porque (também) vou experimentando as intermitências de uma partilha de interesse modesto pela descoberta insaciável do imenso universo das artes plásticas.
Duma banda nesta terra das letras e das palavras, cá o vamos acompanhando, em sentido entusiasmo, na sua eloquência plástica feita percurso artístico muito próprio. À distância. Sob tímidos olhares.
Nos últimos anos, a minha curiosidade indisciplinada e a sua obra crescente convergiram no (re)encontro com o respeitável Zé Cardoso Pires. Velhos amigos nas artes e na vida.
Convergiram, tal como o silêncio e as palavras quando se sussuram. E ganham espaços de multipicidades e cumplicidades.
Como os genesíacos livres traços a carvão que Pomar fazia convergir na expressão assinada de leituras artísticas suas. Veias feitas obras vivas em tela, velando pela boa arte.
Como o escritor que pinta escrevendo palavras de tinta e cor na polifonia da sua voz.
Como o letrista de fado(s) que canta o capricho e a presunção das suas torres de papel ao olhar o amor como mel, talvez sete, em realidades de amargo de fel, no amarelo limão.
Como Carlos do Carmo, em vibratos de sentimento, quando canta as noites mais traiçoeiras, cheias de adjetivos dolorosos, na dor da normalidade infernal, que pasma a pasmaceira.
Como quando vivemos de cara séria, a tecer considerações, quantas vezes a querer parecer o ser, nestas andanças de senhores de computador.
Como quando investidos de pensamento e ficamos atordoados no limbo do frenético e do laser do dito progresso. Só ao machado, à broca e à moca.
E, pasme-se!, consentimos.
Por isso, um letrista que se preza, como Júlio poeta no seu Pomar inspirador, vai pedindo, num fado seu, à sua amada que não o poupe. Com fraqueza, tristeza, perfídia ou aflição que destruam a razão. Não. Ainda mais que levem à frustração. Servida numa bandeja. Decididamente não.
A bem da nação, não quer que isso aconteça. Não quer assentar nessa baixeza.
E termina este artista-pintor-letrista o fado fértil assinado Pomar este seu fado do 112:
«Por favor, peço só/Não te demores, vem logo/Traz gasolina, põe fogo/Meu amor, não tenhas dó».
Descansa em paz, amigo mestre.
Rosa Maria Duarte
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