terça-feira, 17 de janeiro de 2017

Autobiografia (página 16)






Porque é que segui a área de letras?


Eu nasci num ambiente popular, logo não intelectual, apesar de alguma curiosidade e sensibilidade que os meus pais tinham pelas artes do espetáculo e não só... Um bairro de clãs familiares.
A minha mãe chegou a confidenciar-me que, quando era solteira, gostaria de ser escritora e cantora. Quando mo disse, eu ainda nem fazia ideia do que viria a ser a minha vida.
Claro os sonhos dos mortais valem o que valem, mas nascem do fundamento da vontade.
Eu era uma miúda que gostava de coisas de miúdas, mas gostava de acompanhar as brincadeiras da maioria dos elementos da nossa família, que era do género masculino.
E como (quase) todas as miúdas na altura, gostava da ideia de casar um dia e ter filhos. Muitos, de preferência. Conversava com as minhas amigas sobre isso. Respondíamos a questionários das revistas e fazíamos jogos de adivinhas. Com quem casaríamos. Com quantos anos. Quantos filhos. Rapazes ou raparigas... Houve uma altura em que andávamos a brincar à leitura da sina na mão. Eu como tinha alguma imaginação, alguma malta pedia-me para interpretar os traços da sua mão. Eu achava piada à seriedade que atribuíam àquilo.
Com a chegada das telenovelas brasileiras e com a vinda de muita gente de África, as superstições e as interpretações místicas ganharam muita expressão nestes bairros, mesmo entre a gente mais nova.
A escola, por sua vez, encaminhou-me no caminho da ciência e do pensamento. Comecei então a ponderar em prosseguir estudos. Não foi fácil lá em casa...
A minha ideia era o jornalismo. Mas também a par da literatura. Enfim... decidi-me pelo curso de Letras.
Tive diários desde muito cedo. A escrita, não sendo logo o meu interesse maior, foi ganhando ascendente em mim. Fui confrontada pelos professores com a minha crescente competência para escrever.
Gostava muito de Ciências e Tecnologias, mas tinha que seguir um caminho. Venceu as Humanidades e dei continuidade no ensino superior.
Acho que ao princípio surpreendi algumas pessoas com a minha habilidade comunicativa, dado que era mais ouvinte que falante. Mas as pessoas começaram a habituar-se a esta minha faceta de amante das palavras para descobrir a intimidade do acontecer.
A escrita fez-se minha cúmplice fiel e feliz.
Com ela descobri que é bom ser-se humano, nem que seja para podermos comunicar com certas palavras que nascem em esquisso no nosso pensamento, vestem-se como podem de sentimento e são mais ou menos amadas pelo discernimento.

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