O QUE É ISTO DE ESCREVER?
Há já algum tempo que me pergunto
o que é isto de escrever. De escrever timidamente para nós próprios, nos
primeiros textos, em jeito reservado, mas sobretudo depois inevitavelmente para
os outros. Anexados a um simples mail,
agora de acordo com os novos recursos. A seco. Ou arranjados graficamente num
blogue. Para dispensar a alusão ao romântico e insubstituível livro que
continua pacientemente a viver para os rostos dos seus leitores exigentes. Necessidade
de escrever não apenas porque se quer escrever, mas porque há uma inexplicável
compulsão para tal. Como se fosse o tal momento…de inspiração? Obstinação? Transpiração? Descodificação?....
Desde há muito que se discorre sobre a
inevitabilidade do ato criativo. Pontual e circunstancialmente, ou não, em
testemunhos individuais. Sobre qualquer expressão artística. Nureyev, por
exemplo, o famoso bailarino russo, durante uma entrevista, em 1986, afirmou:
“Se me pergunta qual é a minha nacionalidade, qual é o meu país. Bem, o meu
país é o teatro e a minha nacionalidade é bailarino”. Foi este mesmo criativo da
dança que respondeu à questão sobre conselhos a dar a futuros bailarinos,
afirmando que não aconselhava a ninguém um futuro no bailado, a não ser que não
pudesse deixar mesmo de ser.
Então o que é isto da arte? O que é isto de
escrever?
Qualquer definição é precária e incompleta. Não
é facilmente consensual e compreensível para a mente a explicação do fenómeno
da realização humana, que só é autêntica pela criatividade. Mesmo num simples
ato espontâneo de educar.
No meu caso, por exemplo, o que me leva a
escrever? Será para criar um espaço, por excelência, para a comunicação com os
outros, que possa derrubar as barreiras da conversa previsível, circunstancial
e outras limitações envolventes? Ou pelo prazer do recolhimento do momento? Ou pela
distanciação espacio-temporal necessária à receção das ideias e sentimentos por
parte do leitor? Ou simplesmente pela busca de protagonismo e esperanças de
mercantilismo editorial? ( sacrificando o tempo de comer e descansar...)
Não há dúvida que a nossa personalidade, porventura,
precisa de ser reconhecida e encorajada, mesmo nas suas infantis veleidades e
vaidades humanas. E os escritores publicamente conhecidos, mesmo os mais
desprendidos, acabam por beneficiar dessa ovação, eventualmente... Mas, segundo
a minha modesta vivência, a verdadeira literatura não se compadece com ambições
grosseiras e propósitos que se castigam pelo tempo. A própria sociedade se
encarrega da jurisdição do seu próximo menos “catalogado”…por isso, por vezes, o
escritor se remete ao silêncio e à sua intimidade; por isso às vezes o coletivo
não estranha, quando não prefere, a homenagem póstuma… que felizmente se tem contrariado,
é certo. Lembro aqui com satisfação a homenagem recente e sentida feita a
Urbano Tavares Rodrigues, com a sua inestimável presença.
Alguns referendos e muitos inquéritos têm sido pensados para
fazer o levantamento da vontade e da opinão públicas sobre os mais diversos
assuntos nacionais em áreas tão distintas. Com o trabalho de investigação que me
propus fazer, por assumido interesse pessoal, chegou-me a ocorrer incluir no
projeto, inserida no capítulo da metodologia, a aplicação de um inquérito
subordinado ao tema «Estudo da Criatividade Literária». Ainda fui pesquisar
este tópico e vim a descobrir uma publicação espanhola muito interessante, da
responsabilidade de Anthony Percival, intitulada: Escritores ante el espejo, estudio de la creatividad literaria. Trata-se
nada menos do que da primeira publicação, em 1997, de um conjunto de ensaios de
trinta e três escritores representativos de Espanha que partilham livremente
com o leitor a sua experiência de criação literária.
Ora, a ideia de levantamento significativo de
testemunhos de escritores portugueses sobre esta temática implicaria uma ajuda
inestimável de pessoas muito competentes ligadas ao meio académico
universitário e editorial. Seria um trabalho no qual gostaria de participar,
caso mo fosse permitido… sempre consciente de não ser, por razões óbvias, elemento
imprescindível…
Talvez ainda fossemos a tempo de contar com a
ajuda de nomes incontornáveis como o de António Lobo Antunes, Teolinda Gersão, Hélder
Godinho, Agustina Bessa-Luís, Baptista Bastos, Álvaro Manuel Machado, Alice
Vieira, Lídia Jorge, Manuel Alegre, o próprio Urbano Tavares Rodrigues, entre
muitos outros…
laranjeiro, 1 de junho de 2012
Rosa
Duarte
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