sábado, 28 de julho de 2012

o que é isto de escrever


O QUE É ISTO DE ESCREVER?


Há já algum tempo que me pergunto o que é isto de escrever. De escrever timidamente para nós próprios, nos primeiros textos, em jeito reservado, mas sobretudo depois inevitavelmente para os outros. Anexados a um simples mail, agora de acordo com os novos recursos. A seco. Ou arranjados graficamente num blogue. Para dispensar a alusão ao romântico e insubstituível livro que continua pacientemente a viver para os rostos dos seus leitores exigentes. Necessidade de escrever não apenas porque se quer escrever, mas porque há uma inexplicável compulsão para tal. Como se fosse o tal momento…de inspiração? Obstinação? Transpiração? Descodificação?....

Desde há muito que se discorre sobre a inevitabilidade do ato criativo. Pontual e circunstancialmente, ou não, em testemunhos individuais. Sobre qualquer expressão artística. Nureyev, por exemplo, o famoso bailarino russo, durante uma entrevista, em 1986, afirmou: “Se me pergunta qual é a minha nacionalidade, qual é o meu país. Bem, o meu país é o teatro e a minha nacionalidade é bailarino”. Foi este mesmo criativo da dança que respondeu à questão sobre conselhos a dar a futuros bailarinos, afirmando que não aconselhava a ninguém um futuro no bailado, a não ser que não pudesse deixar mesmo de ser.

Então o que é isto da arte? O que é isto de escrever?

Qualquer definição é precária e incompleta. Não é facilmente consensual e compreensível para a mente a explicação do fenómeno da realização humana, que só é autêntica pela criatividade. Mesmo num simples ato espontâneo de educar.

No meu caso, por exemplo, o que me leva a escrever? Será para criar um espaço, por excelência, para a comunicação com os outros, que possa derrubar as barreiras da conversa previsível, circunstancial e outras limitações envolventes? Ou pelo prazer do recolhimento do momento? Ou pela distanciação espacio-temporal necessária à receção das ideias e sentimentos por parte do leitor? Ou simplesmente pela busca de protagonismo e esperanças de mercantilismo editorial? ( sacrificando o tempo de comer e descansar...)

Não há dúvida que a nossa personalidade, porventura, precisa de ser reconhecida e encorajada, mesmo nas suas infantis veleidades e vaidades humanas. E os escritores publicamente conhecidos, mesmo os mais desprendidos, acabam por beneficiar dessa ovação, eventualmente... Mas, segundo a minha modesta vivência, a verdadeira literatura não se compadece com ambições grosseiras e propósitos que se castigam pelo tempo. A própria sociedade se encarrega da jurisdição do seu próximo menos “catalogado”…por isso, por vezes, o escritor se remete ao silêncio e à sua intimidade; por isso às vezes o coletivo não estranha, quando não prefere, a homenagem póstuma… que felizmente se tem contrariado, é certo. Lembro aqui com satisfação a homenagem recente e sentida feita a Urbano Tavares Rodrigues, com a sua inestimável presença.

Alguns referendos  e muitos inquéritos têm sido pensados para fazer o levantamento da vontade e da opinão públicas sobre os mais diversos assuntos nacionais em áreas tão distintas. Com o trabalho de investigação que me propus fazer, por assumido interesse pessoal, chegou-me a ocorrer incluir no projeto, inserida no capítulo da metodologia, a aplicação de um inquérito subordinado ao tema «Estudo da Criatividade Literária». Ainda fui pesquisar este tópico e vim a descobrir uma publicação espanhola muito interessante, da responsabilidade de Anthony Percival, intitulada: Escritores ante el espejo, estudio de la creatividad literaria. Trata-se nada menos do que da primeira publicação, em 1997, de um conjunto de ensaios de trinta e três escritores representativos de Espanha que partilham livremente com o leitor a sua experiência de criação literária.

Ora, a ideia de levantamento significativo de testemunhos de escritores portugueses sobre esta temática implicaria uma ajuda inestimável de pessoas muito competentes ligadas ao meio académico universitário e editorial. Seria um trabalho no qual gostaria de participar, caso mo fosse permitido… sempre consciente de não ser, por razões óbvias, elemento imprescindível…

Talvez ainda fossemos a tempo de contar com a ajuda de nomes incontornáveis como o de António Lobo Antunes, Teolinda Gersão, Hélder Godinho, Agustina Bessa-Luís, Baptista Bastos, Álvaro Manuel Machado, Alice Vieira, Lídia Jorge, Manuel Alegre, o próprio Urbano Tavares Rodrigues, entre muitos outros…



                                                                                 laranjeiro, 1 de junho de 2012



                                                                                              Rosa Duarte


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